sábado, junho 26, 2010

Carta às Testemunhas de Jeová: desassociação - Cleber Tourinho


Abaixo um texto de nosso querido amigo e irmão em Cristo, Cleber Tourinho.

Caro Leitor,

Infelizmente, faltou à Associação Torre de Vigia (ATV) esclarecer às pessoas que o instituto da desassociação não vem de Jeová, mas do Corpo Governante. Se você conjugar todos os paralelos bíblicos em relação ao assunto verá que Jeová está sempre de braços abertos para acolher IMEDIATAMENTE um pecador genuinamente arrependido. Não há nas Escrituras qualquer paralelo que mostre que Ele deu seis meses ou um ano ou vários anos de prova, com a boquinha calada, sentado no banco, sendo ignorada pela família e pelos “amigos”, até que a pessoa fosse JULGADA por um corpo de anciãos como digna de fazer parte de seu povo novamente.
Ao contrário, uma leitura básica da Bíblia te mostrará que PRIMEIRO Jeová acolhe o pecador DEPOIS ele é ajudado a abandonar seu estado lastimável. Basta a pessoa arrependida se voltar para Deus. Sem provas. Sem chibatadas sociais. Sem vergonha ou humilhação. É tão simples!
Vejamos um exemplo: uma jovem tem relações sexuais com seu namorado, contudo, não vê nada demais nisso. Os anciãos a chamam em uma comissão judicativa e a desassociam. Logo após ela se arrepende, pois vê que estava errada. O que fazer?
Bom, Jeová, por meio de Jesus, proveu a resposta. Veja sua reação na parábola do filho pródigo:
“Enquanto [o filho] ainda estava longe, seu pai o avistou e teve pena, e correu e lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou ternamente” (Lucas 15:20).
Mesmo com esse paralelo claríssimo, os anciãos dizem que a pessoa deve passar um tempo no banco, sendo ignorado, apontado como pecador, evitado até pela família... que deve se casar, ou então dissolver esse namoro... que não poderá comentar na reunião, ir no ônibus da congregação para a Assembleia de Circuito, não poderá pegar uma carona no carro de um irmão, muito menos que se deve orar por essa pessoa. Prá não falar que durante esse tempo, a pessoa que “se lixe”, se ela precisar de uma ajuda qualquer, seja em relação a um trabalho, dificuldade na família, doença, emprego, e tantas outras que apenas temos em associação íntima com alguém ou em uma comunidade unida, que ela fique por si só, dê seu jeito... foi ela quem escolheu o caminho da desassociação, não foi? Que amor é esse, hein? Que não pode acolher uma pessoa que está querendo voltar ao seu meio? Que não pode dar um abraço a uma pessoa que precisa? Que não pode perguntar nem mesmo “como vai, como foi seu fim de semana”? Isso é disciplina? Lamento, mas se você é um bom leitor da Bíblia, verá que isso é heresia...
Quanto aos “fundamentos bíblicos” para tal ação da ATV, são todos fraquíssimos e não se sustentam ante o peso da evidência. A Associação usa o texto de 2 João 10, 11 como base de seu tratamento em relação aos desassociados e dissociados. Contudo, empregam tal passagem TOTALMENTE FORA DE SEU CONTEXTO ORIGINAL. Convido-o a ler o texto integralmente, a carta inteira de 2 João. No versículo 7, o apóstolo diz: “Pois, muitos enganadores saíram pelo mundo afora, pessoas que não confessam Jesus Cristo vindo na carne. Este é o enganador e o anticristo".
Depois, do versículo 8 ao 11, o apóstolo dá um conselho aos leitores em relação à situação de perigo espiritual quanto a esses tipos de pessoas que rejeitam a Cristo e pregam o engano, dizendo que Cristo não veio na carne. Contra esse tipo de pessoa é que os cristãos devem se guardar, “nem o recebendo em seus lares, nem os cumprimentando”, pessoas que “se adiantaram”, “não permaneceram no ensino de Cristo” e agora defendem outro ensino diabólico. Ou seja, anticristos ativos e atuantes. Não se fala em lugar algum de crentes que pecaram. Nem em desassociação, palavra que nem na Bíblia está.
Veja a situação delicada que o Corpo Governante põe sobre seus ombros: julgam mais do que Jeová. Aquele que o verdadeiro Deus vê como pessoa aflita e perdida, que precisa de consolo e cuidado, como uma ovelha entre as cem, machucada e desesperada, os CG pede para que vejamos como ANTICRISTOS EMPEDERNIDOS!
Agora, caro leitor, em momento nenhum dizemos ser contra a exclusão ou afastamento de um membro que seja um pecador empedernido do meio da congregação, ou de uma igreja. Isso aí é coisa que se faz até no mundo, nas esferas seculares. Caso você faça parte de uma associação qualquer, um conselho, um clube, uma escola, etc., ou mesmo no trabalho normal, há normas internas que devem ser respeitadas sob pena de (a) repreensão verbal ou escrita, (b) afastamento temporário ou (c) desligamento total.
Isso é diferente das organizações religiosas? Não, de forma alguma.
Ao contrário do que pregam as Testemunhas de Jeová em várias publicações, existem expulsões e desligamentos nas igrejas evangélicas, mas sempre depois de um longo processo de ajuda espiritual à pessoa, antes de serem tomadas as providências cabíveis.
Quando você aceita se tornar membro de uma igreja qualquer, ou de associações filosóficas ou políticas, deve ter em mente suas normas, seus estatutos, entre eles os que podem demandar sua exclusão como membro. Nesse caso, o texto citado pelas Testemunhas, 1 Coríntios 5:9-13, está devidamente aplicado. Paulo escrevia aos crentes em Corinto que não faziam nada para que aquele homem imoral se consertasse, logo, havia negligência espiritual por parte deles. Contudo, lendo com atenção os versículos circundantes (coisa que raramente as Testemunhas fazem), vemos que a grande preocupação era com a ação da própria congregação ante o pecado, não necessariamente com o pecador em si. Não se esqueça de que esta carta que Paulo escreveu tinha objetivos claros: exortar toda a congregação coríntia a um reavivamento espiritual, o que é claramente visível na quantidade enorme de problemas que o apóstolo discute ao longo de sua epístola.
Prova de que está errada a metodologia da desassociação conforme o Corpo Governante das Testemunhas de Jeová prega pode ser vista no modo como a aplicação deste texto é feita na segunda carta de Paulo aos Coríntios. Conforme uma publicação da própria ATV, o Estudo Perspicaz, volume l, p. 563 e 564, “Paulo escreveu esta primeira carta à congregação cristã em Corinto, por volta de 55 EC [...] Paulo escreveu a sua segunda carta aos coríntios provavelmente durante o fim do verão ou começo do outono setentrionais de 55 EC”. Assim, no intervalo de meses, não de anos, nem de décadas, mais em poucos meses, de acordo com o arrependimento daquele “homem iníquo”, “Paulo respondeu na sua segunda carta elogiando-os por sua aceitação favorável e aplicação do conselho, exortando-os a ‘perdoar bondosamente e a consolar’ o homem arrependido, ao qual evidentemente haviam expulsado da congregação” (Perspicaz, v. 1, p. 564).
Quanto ao texto de 2 Tessalonicenses 3:13-15, eu aconselho a seguir o mesmo sistema de leitura exegética, ou seja, a ler o contexto inteiro: “Mas, se alguém não for obediente à nossa palavra por intermédio desta carta, tomai nota de tal, parai de associar-vos com ele, para que fique envergonhado. Contudo, não o considereis como inimigo, mas continuai a admoestá-lo como irmão”.
Nesse caso, não se trata de desassociação, de expulsão, mas dos casos em que um membro da congregação age de forma desobediente. É quase uma “repreensão” como as Testemunhas usam o termo, caso este em que a pessoa não será mais bem vinda a nenhuma reunião social, isto é, a eventos associativos. Se levássemos ao pé da letra, a pessoa realmente deveria ficar “envergonhada”, desde que fosse exposto a partir da tribuna, para todos saberem, que ele ou ela estaria “sob nota”. Mas nem isso as TJ’s fazem direito, pois o processo, na maioria das vezes (ou seja, salvo raras exceções) corre todo em segredo pelo corpo de anciãos...

O que Pascoal, Sebastião, eu e outros questionamos não é a prática da exclusão dos membros em si mesma, que é legítima em qualquer tipo de associação, como disse anteriormente, mas A FORMA COMO ESTE ESTATUTO ESTÁ REDIGIDO E É APLICADO. Trata-se de um flagrante desrespeito aos direitos humanos e uma ofensa a Deus.
Entre os abusos que são feitos está a aplicação hedionda e mal direcionada do que Davi disse no Salmos 139:21-22. A Sentinela 15 de março de 1996, p. 16 par. 6, no artigo “Como passar na prova da lealdade”, coloca os desassociados no mesmo pacote dos piores inimigos de Jeová, de pessoas do mundo, desviados e incorrigíveis, ao dizer:
“Queremos ter a lealdade que o Rei Davi evidenciou ao dizer: “Acaso não odeio os que te odeiam intensamente, ó Jeová, e não tenho aversão aos que se revoltam contra ti? Odeio-os com ódio consumado. Tornaram-se para mim verdadeiros inimigos.” (Salmo 139:21, 22) Não queremos confraternizar com pecadores deliberados, porque não temos nada em comum com eles. Não deve a lealdade a Deus impedir que mantenhamos contatos sociais com tais inimigos de Jeová, quer em pessoa, quer por meio da televisão?”(grifo meu)
Detestável. Ao invés de buscar fazer como o Pastor em Lucas, capítulo 15:1-7, que deixa as 99 ovelhas para correr em busca da perdida, o Corpo Governante manda que pessoas, seres humanos, muitas vezes sem forças nem para retornar para os braços de Deus, para a comunhão com Ele, sejam ignoradas e tratadas com ódio! Imagine! Tudo isso em oposição ao que Deus diz, que devemos ter amor ao perdido, acolhê-lo, aconchegá-lo, para ver se ele retorna de seus maus caminhos (Isa. 55:6, 7; Eze. 33:11; Mal. 3:7).
Conheço casos de pessoas que estão há anos fora das Testemunhas de Jeová e querem até retornar, mas se sentem fracos, sem energia para isso. Algumas me contaram que gostariam que houvesse um programa oficial de ajuda a essas pessoas, mas, ao contrário, as congregações as ignoram. Se ao menos tivessem apoio de suas famílias...! Mas nem isso! Membros das famílias imediatas, que moram na mesma casa, devem apenas conversar o mínimo com essas pessoas, e os que não moram com eles, nem isso! Como uma pessoa se sente nessa situação? Não conheço pessoalmente, mas já li a respeito de casos de depressão, síndrome do pânico e até alguns suicídios de pessoas que não conseguiam mais retornar depois de desassociadas e desistiram de tudo.
De fato, as implicações da prática nefasta da desassociação, através da franca distorção de textos bíblicos e do argumento humano tem feito com que pessoas fiquem aprisionadas a um sistema opressor, sem poderem sair dele. Há casos de TJ’s ativas que não creem mais na Torre de Vigia mas não saem da organização temendo o que pode vir a lhe acontecer: ostracismo exacerbado, perda de laços familiares e de amizades de longos anos, exclusão de uma história de vida inteira, além dos casos mais sérios dos que acreditam sinceramente no Corpo Governante e nutrem sensações terríveis de que, caso pequem e sejam expulsos, deixarão de ser amados por Deus, ficarão sem rumo, sem direção, perdidos de si mesmos, afinal, a identidade das Testemunhas não é delas, é eminentemente vinda das orientações da associação Torre de Vigia.
Cristo nos chamou à LIBERDADE. “E Jesus prosseguiu assim a dizer aos judeus que acreditavam nele: ‘Se permanecerdes na minha palavra, sois realmente meus discípulos, e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará’”. (João 8:31-32). Se estamos em um sistema em que nos sentimos presos, jungidos, sem poder nos mover, está na hora de refletir melhor sobre o assunto.
Cristo nos chamou para AMAR O PRÓXIMO: “[...] eu vos digo: Continuai a amar os vossos inimigos e a orar pelos que vos perseguem; para que mostreis ser filhos de vosso Pai, que está nos céus, visto que ele faz o seu sol levantar-se sobre iníquos e sobre bons, e faz chover sobre justos e sobre injustos. Pois, se amardes aos que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem também a mesma coisa os cobradores de impostos? E, se cumprimentardes somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Não fazem também a mesma coisa as pessoas das nações? Concordemente, tendes de ser perfeitos, assim como o vosso Pai celestial é perfeito” (Mateus 5:44-48).
Notem o versículo 47 desta passagem... Se temos que cumprimentar nossos inimigos, imagine os que se desviaram da fé por conta de um pecado que não seja a renúncia ao nome de Jesus! Deus não iria enviar seu Único Filho à toa, muito menos conceder a Graça (benignidade imerecida) e a Salvação se Ele não estivesse interessado em nós do jeito que somos. Somos todos propensos a falhas, e, da mesma forma, indignos de perdão, mas Jeová quer que nos amemos! É tão simples! Lendo os Evangelhos, você não vê, nem em uma única vez, Jesus evitando alguém por esse ser pecador. Ao contrário, ele ia ao encontro deles! Cristo os amava, os queria ao seu lado, se importava com cada mínimo detalhe de suas vidas, suas lutas, suas angústias, seus medos e fracassos. Isso seria diferente hoje em dia? De maneira nenhuma! Hebreus 13:8 diz: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e para sempre”.

Portanto, caro leitor, a nossa bandeira não é contra a religião das Testemunhas de Jeová. É contra abusos relacionados aos direitos humanos básicos e constitucionais. É contra as famílias que são despedaçadas por práticas religiosas desnecessárias e antibíblicas.
Apesar de sabermos que há erros flagrantes de interpretação bíblica e de modo de vida entre as Testemunhas, eu, pessoalmente, sei que não há como parar de forma séria e comedida sua organização. Porém, há um ditado que meu pai me dizia em vida: “O mal por si se destrói”. Creio sinceramente que um dia, de alguma forma, os males internos da organização da Torre de Vigia serão expostos de forma muito ampla, e, de dentro para fora, as coisas começarão a mudar. Há muito gente lá dentro que não deveria realmente estar, e precisam sair e se encontrar de fato com Cristo Jesus, como eu me encontrei um dia (2 Timóteo 2: 19; Atos 18:7-11).
Espero que você tenha lido com atenção este longo texto construído por mim, que faz parte do livro que tenho planos de concluir, falando sobre a desassociação. Qualquer dúvida, pode escrever diretamente para mim, ao meu e-mail.
Grandes abraços e Paz!

Cleber Tourinho
Professor, Linguista,
Mestrando em Letras e Linguística - Universidade Federal da Bahia - CNPq.
Revisor de textos e orientador em Metodologia da Pesquisa Científica.
ctsantana@gmail.com

(Nota: todos os textos são retirados da Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas, Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, edição de 1986).

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Nas escrituras, tirar os sapatos tem um significado muito especial. Quando Moisés teve seu primeiro confronto com Deus, Ele disse para que ele tirasse seus sapatos porque ele estava em terra santa. Jesus caminhou descalço para o Calvário. Na cultura daquele tempo, estar descalço era o sinal que você era um escravo. Um escravo não tinha direitos. Jesus nos deu o exemplo supremo de renunciar tudo por um grande objetivo.
Loren Cunningham Making Jesus Lord / Marc 8:34,35

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